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“Pranto da Madrugada”: o último artigo da professora Consuelo Pondé de Sena

“Quem me conhece sabe que sou um vulcão em erupção. As lavas que derramo são águas escaldantes da minha “caldeira” interior. Pois, apesar de ser do “grito” de Terra, Capricórnio, sou ígnea. Gosto do fogo e de suas vibrações. Fazer o que se nasci assim?”. Com essas palavras a professora e historiadora Consuelo Pondé de Sena pintou seu autorretrato, ao fazer um relato sofrido e emocionado sobre a doença que viria ser o motivo de seu falecimento na última quinta-feira (14/5), aos 81 anos. Quatro dias antes de ser hospitalizada, Consuelo Pondé havia publicado o texto – que agora soa como uma comovente despedida – na coluna de opinião que a docente aposentada alimentou durante anos no jornal Tribuna da Bahia.

No artigo, a historiadora, que esteve à frente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB) durante cinco mandatos, faz referências à festa de 120 anos do Instituto, além de um pedido especial: que a festa deste ano não seja diferente. “A festa dos 121 anos da instituição cultural mais antiga do Estado deve merecer o apoio de todos os baianos.” Como fez em outras ocasiões, a Associação Bahiana de Imprensa (ABI) reproduz abaixo o texto na íntegra, como forma de homenagear essa baiana que, como diretora da ABI, prestou inestimável contribuição à entidade, tendo dedicado toda a sua vida para preservar a memória da Bahia, sempre na luta por transformações na área da educação e da cultura. Leia a seguir:

Pranto da Madrugada

Desde que passei a conviver com essa “pulmonite”, comecei a experimentar novas e desagradáveis emoções, antes jamais por mim sentidas. Doença terrível que me tolhe o tônus vital, deixando-me diferente do que sou, ou fui. Não tenho certeza de que voltarei a ser a mesma, porque senti na pele a fragilidade da nossa condição humana e me sinto outra pessoa.

São esquisitos estados d’alma, que me deixam aturdida, porquanto não os identificava   como próprios do meu espírito. São situações muito novas, jamais pressentidas. Mesmo porque, não é fácil se imaginar o desconhecido. Que está havendo? O que está se passando? Confesso que não sei responder o que, de novo, se introduziu na minha vida, deixando-me com uma sensação de que sou outra criatura.

Mudei o couro? Penso que, de certa forma, sim. O camaleão não passa por esse processo? Transfigura-se para ser confundido? Sei lá! Dentre milhares de pensamentos desordenados, que povoam meu cérebro está a referida festa, que me deu tanta alegria. Vesti um lindo traje vermelho, que foi muito apreciado por homens e mulheres. É que a cor me fica bem e todos gostam quando a uso.  Este ano, a festa vai acontecer na quarta-feira. Bom dia, porque no meio de semana.

Realmente, estou recordando que a festa do aniversário do IGHB, no ano passado, foi uma beleza. Muitos convidados, sócios, visitantes, homenageados, condecorados com a Medalha Bernardino de Souza. Como sou “pidona” vou pedir uma ajuda em dinheiro para ajudar nas despesas, que não são muitas, mas oneram a Casa, ora em processo de mudança de rede elétrica, que o IGHB ganhou, da Coelba, no “Faz Cultura”.

A Casa da Bahia completou 120 anos. Quis o acadêmico Cajazeira Ramos, da ALB, fazer-lhe uma oferta muito especial. Arrecadou dinheiro, no que foi criticado por algumas pessoas, incapazes de gesto semelhante. Obteve o dinheiro para encomendar o bolo, como era do seu desejo. Um bolo de nozes gigante, que ocupou o mármore inteiro da mesinha redonda antiga. Nem meus médicos podem fazer previsões.

Penso que esse fato, relacionado com outras preocupações pessoais, fazem com que, em plena madrugada, diria mesmo dormindo, acordo chorando sentidamente.

Branca, a moça que me assiste, no período noturno, tenta me consolar, usando palavras carinhosas de alento.

Aos poucos, vou respirando fundo, tentando debelar o choro reparador. Choro que me alivia a alma e desafoga a mente, livrando-a de outras interferências. Espero que as autoridades oficiais compareçam ou mandem seus representantes. A festa dos 121 anos da instituição cultural mais antiga do Estado deve merecer o apoio de todos os baianos. Por outro lado, no seu último pronunciamento no IGHB, o representante do governador Jaques Wagner, Ubiratan Castro de Araújo, declamou enfático ser a instituição “o verdadeiro Museu da História da Bahia”.

Assim, serenamente, aquietada dos meus temores, vou, aos poucos, retomando o sono e dragando a emoção.

Na manhã seguinte, acordo lépida e não parece que senti algo diferente durante a noite de tristeza.  Emoções genuínas são eficazes para a alma cansada, cheia de sentimentos.

Quem me conhece sabe que sou um vulcão em erupção. As lavas que derramo são águas escaldantes da minha “caldeira” interior. Pois, apesar de ser do “grito” de Terra, Capricórnio, sou ígnea. Gosto do fogo e de suas vibrações. Fazer o que se nasci assim?

O pranto da madrugada é uma válvula de escape. Penso ser necessário para restabelecer o que foi “mexido”, bem fundo, bem dentro de mim. Traz de volta tudo que tentei disfarçar, dissimular, para não fazer flutuar os meus desapontamentos, as minhas decepções, as minhas frustrações.

Esse “pranto da madrugada” é algo que apareceu, há pouco tempo, no curso dessa enfermidade. Se vai permanecer comigo, não sei responder. No momento atual me traz muito alívio, disso tenho plena noção. Que fique, portanto, comigo neste momento de tanto sofrimento e de dor.

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Notícias

Jornal ‘La Hora’ protesta contra o controle do governo equatoriano

A imprensa equatoriana agora está concentrada no debate sobre o que deve ser considerada informação de interesse público. Três dias se passaram desde que o jornal La Hora entrou com pedido de direito à resistência, ao decidir não pagar a multa de 3.540 dólares (10.600 reais) imposta pelo órgão de controle dos meios de comunicação do Equador por não difundir a prestação de contas do prefeito da cidade de Loja. A redação do veículo fez uma pausa e seus jornalistas contaram na mesa de reuniões o que escutaram nas ruas. “Dizem que o Governo quer nos quebrar… nos felicitam por nossa coragem… há muito apoio”. O editor-geral, Luis Eduardo Vivanco, declara sobre a rebeldia: “Se não tivéssemos nos declarado em resistência, teríamos aceitado que o poder político imponha os conteúdos e isso seria nefasto para todos que fazem jornalismo”. Em nota divulgada nesta segunda-feira (18), o La Hora afirma que, por meio de seu advogado, vai apresentar uma Ação de Proteção contra a multa imposta pela Superintendência de Comunicação (Supercom).

Audiência La Hora-Foto-reprodução TwitterUma audiência, ocorrida em 4 de maio, foi originada pela denúncia feita na Supercom em 27 de março pelo prefeito de Loja, José Bolívar Castillo Vivanco, e o procurador da cidade, Álvaro Reyes Abarca, que consideraram que La Hora não havia dado suficiente cobertura à prestação de contas do prefeito. De acordo com a acusação, o jornal teria infringido os artigos 18 e 10, inciso 3, alínea f) da Lei Orgânica de Comunicação (LOC), que fazem referência à proibição de censura prévia. O artigo 18 estipula, entre outros, que “os meios de comunicação têm o dever de cobrir e difundir os fatos de interesse público. A omissão deliberada e recorrente de temas de interesse público constituem ato de censura prévia”.

Segundo recordou a defesa do jornal, a Corte Constitucional determinou que o Conselho de Regulação e Desenvolvimento da Informação e Comunicação (Cordicom) deveria expedir normativas para estabelecer os parâmetros para definir informação de “interesse público”. Algo que não aconteceu até o momento. “Sim, estamos diante da possibilidade de que as autoridades públicas ditem aos meios livres o que devem publicar, caso contrário: multa”, disse Luis Vivanco, em um artigo publicado em 30 de abril. “Querem nos obrigar a publicar o que eles consideram de interesse para seus fins políticos, atropelando todo critério de independência midiática”.

Em várias oportunidades, a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) expressou sua preocupação pelo uso da LOC para restringir a liberdade de expressão. Em uma carta enviada ao Estado do Equador, quando a LOC foi aprovada, a Relatoria Especial manifestou sua preocupação sobre os pontos que poderiam por em risco o direito à liberdade de expressão no marco desta nova lei.

Resistência

O jornal La Hora e suas filiais receberam mais de dez denúncias. Pagaram à Superintendência de Comunicação cerca de 14.000 dólares (42.000 dólares) pela divulgação antecipada de critérios judiciais em dois casos policiais. veículo já havia se declarado em resistência em março passado, quando se negou a pagar uma multa de 1.770 dólares (5.300 reais) por não ter identificado como publicidade a carta aberta escritapor um representante do Conselho de Participação Cidadã a Rafael Correa. Desde então a situação do jornal não tem sido fácil. Os jornalistas têm cada vez mais dificuldade para trabalhar. “É um ambiente de pressão, você se cuida muito mais, no momento de escrever precisa se cuidar porque não sabe em que ponto podem atacar”, conta Andrea Grijalva, que cobre saúde e educação. “É bonito defender o jornalismo, mas quando as regras do jogo não são claras, pensamos duas vezes antes de escrever algo ou de fazer certas perguntas”. Além disso, as fontes oficiais estão fechadas para os jornalistas do La Hora.

O órgão de controle da mídia, em seu relatório de 2014, afirmou que havia emitido 113 sanções contra os meios de comunicação. A maioria tinha sido advertências escritas e pedidos de desculpas públicas e retificações. Mas também há multas por não publicar as retificações, por não publicar a tiragem, por não entregar cópias dos programas, por não etiquetar o tipo de conteúdo jornalístico (informação, opinião, entretenimento ou publicidade), por tomar postura institucional e por publicar conteúdos discriminatórios ou restritos como os relacionados a menores de idade.

*Informações do El País, La Hora e Centro Knight para o Jornalismo nas Américas.

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