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Como a avalanche da fake news contribui para o ódio à população LGBTQ+

Por Baga de Bagaceira *

Primeiramente, farei em alguns momentos conexões com meu último texto publicado aqui no site da Associação Bahiana de Imprensa, intitulado “tecnologia: o que fazemos com ela e o que ela faz conosco?”, e as formas e usos dessa ferramenta nos embates antagônicos em que envolvem-se as opressões e os enfrentamentos às violências direcionadas a população LGBTQ+. Essa mesma população, englobada por gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneras, queers e demais pessoas (ainda) vistas como “anormais”, tem usado, inclusive, as redes para expandir suas afetuosidades e reclamar por mais direitos, além de denunciarem casos de ódio.

Nesse sentido, as redes tem se tornado um forte pesadelo para uma população que arduamente vem ocupando espaços e disputando poder, que antes eram dados apenas aos indivíduos detentores de expressões sexuais e de gênero tidas como ideais. Entre ameaças, xingamentos e, principalmente, assassinatos, muitos LGBTQs se viram em situações em que tiveram que abandonar o seu país, como foi o caso do ex-deputado Jean Wyllys, que teve suas redes invadidas por ameaças contra a sua pessoa e sua família, conforme afirmou na imprensa. O único deputado, até aquele momento, que teve a coragem de assumir sua orientação, Jean, já foi e ainda é alvo de duras críticas contra a sua atuação em favor das minorias sexuais e foi alvo também das terríveis fakes news, as notícias falsas e condescendentes da hipocrisia que tanto enfrentou.

Acompanhamos nos últimos meses, principalmente após as cisões políticas que se instauraram em nosso País, ataques ferozes aos grupos minoritários, e com eles vieram as ferramentas tecnológicas, que apesar de se abrirem para um caminho de avanço da comunicação, também deram espaço para a contagiosa e descontrolada fake news, que rapidamente se espalhavam em seus formatos e conteúdos midiáticos. Posto isso, um certo descrédito contra essa comunidade foi chave de grande repercussão ao que realmente representa a luta contra a lgbtfobia; acreditaram piamente na “mamadeira de piroca” e usaram a falsa notícia em um momento político delicado em que era mais propício desacreditar em uma comunidade já jogada para o escanteio do que ferir a moral e os bons costumes da tradicionalíssima família brasileira. Diversas informações eram repassadas sem a menor responsabilidade por esses aplicativos, estirpando qualquer notícia que tivesse ligação com as minorias, principalmente àquelas relacionadas a população LGBTQ.

Como comentávamos, anteriormente, de Jean Wyllys e vendo a proporção que essas notícias falsas tomaram, é até difícil de imaginar que há 14 anos, quando Jean estava num reality show, a história de um homossexual pobre e do interior da Bahia pudesse comover tanto, a ponto daqueles que o discriminaram no programa terem saído com altos índices de rejeição. Sim, uma década muda muito, assim como a forma de propagar as notícias também: informações rápidas, extremamente velozes se espalharam e a nossa comunicação, além de rara, foi ficando cada vez mais à mercê dos grupos sociais. Ali não havia espaço, na maioria das vezes, para questionamentos ao que estava sendo compartilhado. As mentiras que se espalharam e que vem se espalhando nesse cenário fake diz não só apenas sobre como a notícia nos impacta, mas também como ela pode reforçar preconceitos, instigando determinados imaginários naqueles/as que sempre (ou quase) enxergaram LGBTQs como promíscuos, frescos ou aberrações.

Quando afirmamos isso, não fazemos apenas porque queremos levantar a bandeira LGBTQ, mas sim, fazemos por ela também; assim também, porque uma inverdade replicada pode levar a noticia à descredibilidade ou a falência do jornalismo diário e sério que se preocupa em apontar os fatos de forma respeitosa, sem que haja qualquer direcionamento a uma política que vise estigmatizar ou afundar, principalmente tratando-se de uma comunidade historicamente silenciada. Portanto, o compromisso não é apenas com a verdade, porém é também com o respeito e a tolerância que tanto prezamos diariamente em nossos discursos.

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*Baga de Bagaceira Souza Campos é jornalista, performer, mestre em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação – Mídia e Formatos Narrativos – da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), na linha de pesquisa Mídia e Sensibilidades.

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).


					
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