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STF determina até onde vai o direito à liberdade de expressão da imprensa

Pode um órgão de imprensa ser impedido de veicular determinada informação, ainda que muito antiga e verídica, por conta das cargas emocionais que ela traz para uma pessoa ou seus familiares? Quais são as situações em que essa proibição está autorizada? Deve haver relevância histórica no fato narrado? Está autorizada a censura prévia? Todas essas questões estão diretamente relacionadas ao direito ao esquecimento e seu potencial conflito com a liberdade de expressão, matéria a ser analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O recurso chegou ao órgão jurisdicional em dois processos distintos. O primeiro refere-se ao caso “Aída Cury”, cuja família da vítima do apavorante crime ocorrido no Rio de Janeiro em 1958 propôs demanda indenizatória em face da TV Globo por causa de programa veiculado em 2004 pela emissora, no qual os detalhes da tragédia foram relembrados. O segundo processo trata da ainda famosa “Chacina da Candelária”. Neste caso, um dos suspeitos do crime, posteriormente absolvido, promoveu ação de reparação de danos, também em face da TV Globo.

Programa televisivo explorou o caso em 2004 e provocou a indignação da família da vítima - Foto: Reprodução
Programa televisivo explorou o caso em 2004 e provocou a indignação da família da vítima – Foto: Reprodução

No “Caso Aída Curi”, pretende-se que um fato extremamente doloroso faça parte do passado e não seja relembrado por programas noticiosos com caráter de entretenimento. Os irmãos a vítima alegam que notificaram a empresa sobre a objeção à lembrança do episódio e alegam que “a transmissão foi conduzida de forma extremamente desrespeitosa, mostrando cenas chocantes e sem qualquer interesse público”. A emissora, por sua vez, alega que as informações estão disponíveis em arquivos públicos e fazem parte da história brasileira. Segundo a empresa, a exibição tinha como objetivo “trazer à baila questões importantes como a violência contra a mulher, a impunidade e a responsabilidade penal de menores de idade”. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou o pedido da família.

Para o ministro do STF Luis Roberto Barroso, o direito à privacidade não pode limitar a imprensa. “A liberdade de expressão deve ser tratada como preferencial porque é pressuposto para um bom exercício de boa parte dos direitos fundamentais da democracia”, afirmou Barroso durante evento no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Ele lembrou o histórico de cerceamento das liberdades no país, especialmente durante a ditadura militar, em que os veículos de imprensa passavam por censura prévia. O ministro ponderou, contudo, que a liberdade de expressão não é um direito absoluto e que a questão deve ser julgada caso a caso. Ao reconhecer o direito fundamental ao esquecimento, o intérprete constitucional imediatamente cerceará a possibilidade de que determinado assunto seja debatido ou relembrado nos espaços públicos de veiculação de informações, tais como televisão, rádio, imprensa escrita e, especialmente, internet.

Em relatório publicado em novembro no acórdão que definiu que o processo será julgado pelo Supremo, o ministro-relator Dias Toffoli escreveu que “esse julgamento terá o condão de detalhar e tornar um pouco mais nítida a proteção à dignidade humana frente aos órgãos de mídia e de imprensa”, uma vez que a decisão da Corte deverá ser acatada por outras instâncias judiciais. A legislação brasileira permite decisões favoráveis tanto à privacidade quanto ao direito à informação. Para Laura Schertel, especialista do IDP em direito à privacidade, a questão deve ser tratada com cuidado por envolver a colisão de direitos. “A difusão de informações é muito importante para a democracia e para a liberdade de expressão, mas por outro lado elas também trazem riscos à personalidade”, afirma.

Praticamente todos os segmentos da sociedade brasileira são alcançados pelo STF, que examina controvérsias relativas a uma multiplicidade de temas, a exemplo da liberdade de expressão, suas múltiplas formas de concretização e seus possíveis limites. Questões fundamentais já estão sob o exame da Suprema Corte brasileira: o direito ao esquecimento, seja no que se refere às atividades televisivas, seja no que concerne às novas tecnologias; a possibilidade, ou não, de censura prévia a biografias; a extensão da tutela constitucional ao sigilo da fonte, especialmente na perspectiva do vazamento de informações no âmbito de processos criminais sob segredo de justiça;  a liberdade de expressão em matéria eleitoral, notadamente no âmbito da atividade jornalística e/ou humorística, entre outras.

Trata-se de temas novos, extremamente presentes em nosso cotidiano, e que ainda aguardam reposta jurisdicional adequada, já que as polêmicas geradas revelam que, em tempos de Blogs, sites de notícias, Facebook, Google, Twitter, Instagram e Whatssapp, a velha noção de liberdade de manifestação do pensamento, repetidamente examinada pela Suprema Corte brasileira, é cada vez mais questionada.

 *Informações do Correio Brasiliense,Portal IMPRENSA e Jota.info

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