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Obra da jornalista Antonieta de Barros entra em domínio público

Em 1937 foi lançado no Brasil o livro Farrapos de Ideias, de autoria de Maria da Ilha. Por trás do pseudônimo estava a política, educadora e jornalista Antonieta de Barros (1901-1952). Farrapos de Ideias e outras crônicas assinadas pela escritora símbolo da resistência negra catarinense e brasileira devem entrar em domínio público em 2023, segundo o portal especializado em literatura publishnews

De acordo com a Lei N.º 9.610/1998, que rege o direito patrimonial dos autores no Brasil, as obras entram em domínio público no dia 1° de janeiro do ano subsequente em que os autores completam 70 anos de falecidos. Com isso, em 2023 entram em domínio público obras de autores que morreram em 1952, como é o caso de Antonieta, que morreu aos 51 anos por complicações da diabetes. O portal www.dominiopublico.gov.br, no entanto, ainda não retorna resultados para a busca pelo nome da autora. 

A obra de Antonieta é marcada tanto por comentários e observações da vida cotidiana e política como por suas preocupações com questões sociais, a exemplo da defesa do acesso à educação por mulheres e o combate ao analfabetismo. No ano passado, Farrapos de Ideias foi reeditado pela Skrip Editora. O livro reúne crônicas publicadas no jornal República e ganhou uma edição de luxo.  

Memória
Em 2020, no Dia Nacional da Consciência Negra, a ABI resgatou a vida e a obra de Antonieta de Barros em um especial assinado por I’sis Almeida. Antonieta nasceu em 11 de julho de 1901, em Florianópolis-SC. Antes de sua participação na política, como deputada estadual em seu estado, a partir do primeiro ano em que mulheres puderam votar e serem votadas, aos 21 anos Antonieta fundou e foi diretora do jornal A Semana, entre 1922 e 1927. Também dirigiu, em 1930, a revista quinzenal Vida Ilhoa. Foi cronista dos jornais O Estado e República, onde assumiu, por diversas vezes, o pseudônimo de Maria da Ilha. Em 1937, publicou o livro Farrapos de Ideias.

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Literatura

Solitário do lado de fora

Aloísio da Franca Rocha Filho*

“Solitário do lado de fora…”

Solitário do lado de fora
percebo dentro de ti ainda
o que restou de nós…
fragmentos…
não têm centro…
caem pela tangente dos teus olhos
inteiros…
tua alma…teu doce sorriso
me animava
e das perguntas do meu semblante
respostas mudas valiam menos
do que beijos…
eles me convenciam mais
torci para que perdesses
o trem
preferiste ganhar os trilhos
na estação do aceno vão…

e… enquanto…
enquanto o trem apitava…
suas rodas de aço
sobre trilhos… sobre dormentes…
ensaiavam as primeiras notas
de sua antiga cantiga…
“café com pão
manteiga não…”
“café com pão
manteiga não…”

“Em algum lugar…”

Em algum lugar
onde a vida não seja um sopro
e reine um silencio total
para um homem
qualquer, existe?
Metafísica…
metafísica do
silencio total
jamais escutei
esse a b s o l u t o…
quem já o ouviu?
voo raso de uma vespa-fada voadora
derrubaria seu
reino…

No banco do jardim um…”

 no banco do jardim um velhinho
cabeça toda branca descansa
os passantes olham-no
como a dizer
a vida é longa…
fotografam…
soprando o vento a favor ali
e contra eles o futuro próximo
se lograrem aqueles fios brancos…
quão breve a vida…
dirão

______

O atributo alt desta imagem está vazio. O nome do arquivo é aloisio-da-franca-rocha-filho.jpg

*Aloisio da Franca Rocha Filho é professor e jornalista; ex-diretor da Associação Bahiana Imprensa (ABI)

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Literatura

Palavra muda…

Aloísio da Franca Rocha Filho*

Palavra muda…

livre para dizer

o que quiser

a qualquer tempo

em um lugar qualquer…

esse rumor melódico-surdo na boca

é só seu…

palavra…

ouça… palavra muda… sem peso…

mas muda tem som

surdo…

enquanto muda 

nada muda…

na dicção cortante

do ar ao fado  

pode dar felicidade…

na dicção cortante

do ar ao fado  

pode ferir de morte…

    m u d a…       

quando a arremetem para

teu leito branco…

 aqui…ou lá…

ganhas peso

                          m u d a…

és então

usina de sons altissonantes…

és então

usina multiforme de sinais gravados

a arma… o ataque…

o amor… a paixão…

a liberdade… a defesa…

 o fogo… o gelo…

a proteção…a salvação…

a perdição…

do homem

com as rezas ou

não da oração…     

    P A L A V R A

             M U D A…

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“O esquecimento é um sonho”

O esquecimento é um sonho…

imprevisível nos acomete 

depois…

sutil fantasiado 

retorna dissimulado…

 mas não esquecido.

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“Do antepasto a sobremesa…”

Do antepasto a sobremesa…

comensais fruem

suceSSo

de

tempos temerários

retroceSSo

a tinta pinga vermelho.

Não!!!                                                                                                            

É o sangue rubro imanente 

que pinta a tragédia…

______

O atributo alt desta imagem está vazio. O nome do arquivo é aloisio-da-franca-rocha-filho.jpg

*Aloisio da Franca Rocha Filho é professor e jornalista; ex-diretor da Associação Bahiana Imprensa (ABI)
(Texto originalmente publicado na coluna de Literatura do site Bahia Notícias)

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ABI BAHIANA

Debate sobre interfaces entre jornalismo e literatura encerra simpósio promovido por ALB e ABI

O que o jornalismo tem a ver com literatura, além do óbvio pertencimento de ambos ao campo das letras? O que literatura tem a ver com fatos, com realidades? Quais são os limites e as especificidades de um gênero e de outro? Com essas provocações, a premiada jornalista e escritora Suzana Varjão esquentou a mediação da mesa “Jornalismo e Literatura: Interfaces”, que encerrou o I Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura, na noite desta sexta-feira (9). O evento, realizado desde o dia 7 pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e pela Academia de Letras da Bahia (ALB), reuniu escritores, acadêmicos, pesquisadores, jornalistas e profissionais de diversos campos do conhecimento, dispostos a conversar sobre as confluências e aproximações entre o fazer jornalístico e a literatura.

O último debate do Simpósio foi protagonizado pelo escritor Antônio Torres, jornalista, membro da ALB e da Academia Brasileira de Letras (ABL), pela jornalista e escritora Aline D´Eça, autora do livro-reportagem Filhos do Cácere (Edufba), e pelo doutor em ciências da comunicação Edvaldo Pereira Lima.

Ernesto Marques, presidente da ABI, deu boas-vindas ao público, com uma reflexão sobre o momento atual vivido no Brasil. Ele falou da esperança de que o próximo simpósio realizado pelas entidades encontre outro ambiente. “Desejo que já não seja necessário fazer a exortação, a defesa da democracia, a nossa pregação contra o obscurantismo, feita reiteradamente pelo professor Ordep”, ressaltou. O jornalista também comentou sobre as dificuldades impostas pela pandemia, como a impossibilidade de realizar eventos presenciais. “Que possamos nos reunir no auditório, claro, sem prejuízo de ampliar essas páginas digitais e levar o conteúdo para quem, em outras partes do País ou do mundo, possa se interessar em participar. Esse evento tem nos proporcionado noites ricas de conteúdo e aprendizado”, avaliou.

Marques aproveitou para lembrar que neste sábado, 10, acontece o lançamento do Site Walter da Silveira, com transmissão ao vivo pelo Youtube da ABI. O espaço compartilha com o público uma parte consistente do acervo do militante político, professor, historiador, cineclubista, ensaísta, advogado e um dos mais importantes críticos de cinema brasileiro.

O presidente da ALB, professor Ordep Serra, agradeceu a presença do público e também reiterou a continuação da parceria com a ABI. “Estamos dispostos a fazer o segundo Simpósio e vamos ter outras iniciativas que vão consolidar nossa aliança”, garantiu. Para ele, o evento é uma oportunidade de pensar, de refletir, sobre aspectos importantes do ponto de vista social. “É uma alegria começarmos a terceira noite desse simpósio. Mais uma festa da inteligência, para interromper, nem que seja por um trecho da noite, a dor e a preocupação que acomete a todos nós, vítimas de um genocídio. Porque a pandemia já tomou, no Brasil, essa dimensão sinistra de um genocídio, realizado com absoluta crueldade por um governo federal que não se respeita”, criticou.

A mediadora Suzana Varjão, pesquisadora baiana e autora de cinco livros, disse da satisfação em assumir o papel de intermediar o intercâmbio de ideias, diante da qualidade da mesa composta por três intelectuais brasileiros. “Trata-se hoje de uma conversa sobre a palavra. O que significa dizer sobre um poderoso instrumento de construção de mundo. Sim, porque palavra é coisa muito séria. Afeta, legítima, gera realidades. Não obstante o ceticismo, ou mesmo inocência de alguns, palavras não são neutras, não são puras, não são acéticas. Carregam valores que são repassados para todo e qualquer sistema por mais operacional que seja”, situou.

“Vamos falar então sobre um lugar do jornalismo que eu poderia definir de uma maneira mais rudimentar como processo de coleta e investigação, análise e transmissão de informações. Vamos falar sobre o lugar da literatura, que se pode descrever de modo elementar como uso estético da linguagem, mas vamos falar também sobre lugares ou entrelugares, que são as interfaces”, provocou a jornalista. “Literatura é sinônimo de ficção? E jornalismo é sinônimo de relatório, de reprodução, reflexo?”, questionou.

Contando histórias

Membro da Academia de Letras da Bahia, onde ocupa a cadeira número 9, na sucessão a João Ubaldo Ribeiro, e da Academia Brasileira de Letras, o escritor Antônio Torres narrou a sua chegada ao jornalismo. O autor da trilogia formada por Essa Terra, O cachorro e o lobo e Pelo fundo da agulha, entre outras obras, iniciou a sua carreira como repórter do Jornal da Bahia, cujo fundador foi João Falcão. Como bom contador de histórias que é, Torres contou desde a sua primeira crônica publicada no Alagoinhas Jornal, que saía uma vez por mês no município baiano, até a sua transferência para o diário Última Hora, de São Paulo, tendo posteriormente atuado na área da publicidade.

“Jornalismo foi o meu caminho natural para a literatura. Estudava no ginásio em Alagoinhas e eu ousei pedir ao dono do jornal para publicar um artigo. Já era um começo via literatura, porque esse artigo era sobre o maior biógrafo de Monteiro Lobato, Edgard Cavalheiro, escrito no dia de sua morte, em 30 de junho de 1958”, relatou. A partir daquele momento, o dono do Alagoinhas Jornal lhe franqueou o espaço que lhe oportunizou conhecer e trabalhar no Jornal da Bahia, com nomes como Adroaldo Ribeiro Costa, Ariovaldo Mattos e João Carlos Teixeira Gomes, o Pena de Aço. “Ali eu começava a minha primeira faculdade de jornalismo e de literatura, já que em 1959 não existia faculdade de jornalismo”, lembrou.

Ele conta que encontrou dificuldade, devido ao seu estilo mais literário, para escrever segundo pedia o jornalismo diário. Até que um livro lhe ensinou a responder às famosas perguntas que compõem a primeira parte de uma notícia – O Quê? Quem? Quando? Onde? Por quê? e Como?. “Eu aprendi que você tem que responder isso para tudo”, brincou. Depois de um ano trabalhando no Última Hora, Torres foi convidado para trabalhar em publicidade. “Minha primeira escola foi o jornalismo, a segunda foi a publicidade. O jornalismo me ensinou a ver o mundo e a publicidade me ensinou a contar isso rapidinho. É a síntese da minha história”, conclui o escritor.

A jornalista e escritora Aline D´Eça trouxe sua experiência como autora de livro-reportagem, ao relatar o processo de construção de Filhos do Cárcere, uma obra que teve origem em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e que traz a perspectiva de filhos e filhas de mulheres encarceradas. A baiana de Nazaré das Farinhas refletiu sobre as relações entre jornalismo e literatura, suas diferenças e semelhanças, além de estabelecer paralelos com estudos da área da psicologia. A experiência com a reportagem que originou o livro despertou em Aline a vontade de deixar a carreira jornalística e estudar psicologia analítica. “O jornalismo literário tem muito a ver com a psicologia, porque se propõe a um mergulho na realidade, para retratá-la para aqueles que não conhecem”, explicou.

Ela recorreu aos ensinamentos do professor Edvaldo Pereira para dizer que o livro reportagem é, muitas vezes, fruto da inquietude do jornalista, que tem algo a dizer com profundidade, mas não encontra espaço para fazê-lo na imprensa cotidiana. “Apesar de eu não ter visto quase nada sobre jornalismo literário na faculdade, estudei por conta própria. O que a gente faz? Utiliza recursos como observação, descrição, narração, uso de símbolos e de metáforas, para tornar o texto mais atraente”. Aline ressalta que o jornalismo literário dá ao repórter a oportunidade de captar não só a realidade concreta dos fatos, mas também a realidade emocional das personagens envolvidas naquela história. “O jornalismo literário preenche o vazio de profundidade deixado pelo furo jornalístico, pela ânsia por notícias efêmeras”, analisou.

Embora não haja no jornalismo diário espaço físico para a publicação desse tipo de texto, Aline D’Eça defende que existe interesse dos leitores por algo que vai além do que chamou “fast-food jornalístico”. A autora destacou diferenças entre as atividades. “É possível ficcionar o jornalismo literário? Eu diria que é perigoso. Mas essa construção pode ter base numa apuração detalhada, entrevistas criteriosas, exaustivas, com bastante documentação. A partir daí a gente pode chegar próximo do real, recriar cenas e ambientes que estão por trás da notícia. O que não se pode em jornalismo é inventar. Colocar no texto algo que esteja distante do real. Isso não é jornalismo, é ficção”, advertiu.

Humanização de narrativas

Foi em busca da humanização dos relatos que Aline decidiu escrever o livro-reportagem. “Queria descrever os cheiros, as cores, as emoções, e não somente me ater aos números. Infelizmente estamos hoje vivendo uma realidade que os números nos assustam, mas não nos dá profundidade de todas as histórias por trás dos números”, disse, em referência à pandemia provocada pelo coronavírus. “O jornalismo literário busca preencher esse vazio de sensibilidade. E aqui está a diferença entre o jornalismo e a ficção. O jornalismo literário tem o estilo semelhante à literatura, mas traz histórias reais”, afirmou.

Autor de 17 livros, entre obras acadêmicas e livros direcionados ao grande público, o jornalista Edvaldo Pereira Lima também ressaltou a necessidade de humanizar as narrativas e estimular um mergulho mais profundo na realidade, levando a população a transformar a sua consciência, o seu nível de entendimento do real e de ação.

“Neste momento em que a ciência está trazendo comprovadamente novos modelos de compreensão da realidade e novos modelos que nos trazem os instrumentos de transformação da sociedade para melhor, é um dever da literatura e do jornalismo se reciclarem e acompanharem esse progresso”, indicou. Segundo ele, é preciso praticar a narrativa de profundidade, que traga a capacidade de alavancar e estimular a mudança de percepção do leitor. “Você faz isso usando instrumentos narrativos centrados essencialmente no ser humano, não contando as histórias só apoiadas nos números e nos relatórios abstratos sobre a realidade”, aconselhou.

“E qual é a arte narrativa que está à disposição da literatura e do jornalismo? Uma arte que tem instrumentos de percepção e de expressão comprovados ao longo de milênios em todas as culturas e que se adapta e se moderniza, na medida em que novos achados e novas descobertas vão aparecendo. É a arte de contar histórias. Todos nós aqui temos em comum o amor e a paixão por contar histórias”, afirmou o escritor.

Saiba como foi o Simpósio

Quem perdeu as discussões do I Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura, tem a oportunidade de assistir aos três dias de evento pelo Youtube da Academia de Letras da Bahia. A entidade, junto com a ABI, proporcionou uma noite memorável em defesa da democracia neste 7 de abril, Dia do Jornalista, durante a abertura do Simpósio. A primeira mesa discutiu os “Limites da liberdade de expressão e direitos hoje, no Brasil”, com as participações do jornalista, escritor, e ex-professor da Faculdade de Comunicação da UFBA, Emiliano José, do professor-titular de jornalismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Muniz Sodré, e do professor-titular da Facom/UFBA, Wilson Gomes. A mediação ficou com a jornalista Jussara Maia, professora de Jornalismo do Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

Já a segunda noite do Simpósio, nesta quinta-feira (8), teve como destaque um debate profundo sobre os desafios e as mudanças ao longo da história do jornalismo cultural na Bahia e no Brasil. Com o tema “O espaço e conteúdos de cultura nos jornais, televisão, rádio e plataformas digitais”, os conferencistas Sérgio Mattos, Kátia Borges e Malu Fontes realizaram um apanhado no tempo, relatando experiências da época de graduação e refletindo sobre os novos rumos do setor. A mediação foi assumida pela jornalista Simone Ribeiro, diretora do departamento de Divulgação da ABI.

  • Assista aos debates do Simpósio nos links abaixo:

Mesa I – “Limites da liberdade de expressão e direitos hoje, no Brasil”

Mesa II – “O espaço e conteúdos de cultura nos jornais, televisão, rádio e plataformas digitais”

Mesa III – “Jornalista e Literatura: Interfaces”

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