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Festa do “2 de julho” exalta luta de Salvador contra o domínio português

Era pouco mais de seis da manhã, quando uma alvorada de fogos rompeu o silêncio do Largo da Lapinha, dando início aos festejos do Dois de Julho, data em que é celebrada a Independência do Brasil na Bahia. Sob o tema “Salvador – Marco da Independência”, a Bahia comemorou 194 anos da revolução anticolonial, exaltando a contribuição da primeira capital do país no combate ao domínio português. Hasteadas as bandeiras, os carros que levavam o Caboclo e a Cabocla seguiram em direção ao Campo Grande. Eles só retornarão à Lapinha para encerrar as comemorações, na próxima quarta-feira (5).

Além de ser feriado estadual e efeméride nacional, o 2 de Julho é Patrimônio Cultural Imaterial da Bahia, por motivos sócio-antropológicos, históricos e simbólicos. Em 1823, nesta data, as forças brasileiras entraram em Salvador, tomaram a cidade de volta e consolidando a vitória, já que mesmo com a declaração de independente, em 1822, o Brasil ainda precisava se livrar das tropas lusitanas.

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Ao longo das ruas, ladeiras e praças, os baianos resgatam anualmente a história dessas lutas, através das tradicionais fanfarras, desfiles de colégios estaduais, de militares, dos movimentos sociais, dos grupos de samba e batucadas. O heterodoxo cenário do cortejo cada vez mais incorpora novos elementos e se reinventa. É no miolo destas festividades que se nota a mescla do caráter histórico e oficial com as manifestações e protestos culturais populares.

A história é contada através das fachadas das casas - Foto: Tarsilla Alvarindo
A história é contada através das fachadas das casas – Foto: Tarsilla Alvarindo

Embora este ano não tenha sido realizado o tradicional concurso cultural “Decoração da Fachada – 2 de Julho”, a empolgação de quem ajuda a dar cor ao trajeto não foi abalada. Na frente da casa de número 34, à Rua Direita do Santo Antônio, encontramos Maria Quitéria e outros heróis do evento cívico. Todos os ilustres personagens interpretados pelos netos de Maria de São Pedro, que há mais de quatro décadas mora no local. Aos 77 anos, Dona Peu, como é conhecida por todos, nasceu no dia 2 de julho e é uma das moradoras que capricham nas fachadas das casas. Há 20 anos, ela conta com o auxílio da família para abrilhantar o desfile, com cenários que envolvem personagens históricos e elementos da fauna e da flora brasileira.

Toda a ornamentação é feita pela estilista e artesã Nea Santtana, filha de D. Maria. Ela levou um ator muito especial este ano. Vestido de índio e pulando de alegria, lá estava seu filho, o pequeno Arthur, de 1 ano e 10 meses. “A emoção em vê-lo participando foi única. Eu lembrei de quando saí pela primeira vez [vestida] de Maria Quitéria. Foi muito lindo”, afirma Nea, ao recordar a época em que ela fazia parte do elenco.

Dona Maria, 77 anos, faz aniversário no Dia da Independência - Foto: Nea Santtana
Dona Maria, 77 anos, faz aniversário no Dia da Independência – Foto: Nea Santtana

Durante todo o percurso, famílias acenavam das janelas que se tornaram camarotes com vista privilegiada para o espetáculo de cores, em um dia repleto de manifestações artísticas, políticas, culturais e religiosas. Quem faz de tudo para não perder o desfile é a advogada baiana Magnólia Regis, que mora na cidade do Rio de Janeiro há mais de 30 anos, “Estudei no Colégio Severino Vieira, em Nazaré, e defendo o ensino dos nossos hinos nas escolas brasileiras. Temos que manter essa belíssima tradição das fanfarras e não deixar a história de perder. O apagamento do nosso passado e a ignorância do povo é conveniente para quem está no poder”.

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Já são três anos sem a presença de uma importante ativista da luta pela preservação da memória da Bahia e valorização da festa da Independência, a professora Consuelo Pondé de Sena, ex-presidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB). Uma missa realizada na manhã de sábado (1º), na Igreja São Pedro dos Clérigos, homenageou a historiadora falecida em maio de 2015, aos 81 anos, vítima de uma arritmia cardíaca.

Vitrine

No dia anterior aos festejos do Dois de Julho, a Prefeitura avisou fiscalizaria e multaria, caso constatasse qualquer publicidade irregular ao longo do cortejo, o que inclui os famosos balões, faixas, placas e painéis publicitários. Segundo o diretor de fiscalização da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur), Átila Brandão Júnior, a intenção seria “deixar a plástica e a estética do desfile mais prazerosas e mais atrativas”, já que em 2016, 256 peças irregulares foram apreendidas. Ainda de acordo com a Prefeitura, a proibição tem como base o decreto 12.642/2000, que versa sobre o ordenamento da publicidade na paisagem do Município.

Irreverência no protesto contra a corrupção- Foto: Margarida Neide/A Tarde
Irreverência no protesto contra a corrupção- Foto: Margarida Neide/A Tarde

Mas nem mesmo a proibição ameaçou o caráter político da festa. Alguns manifestantes vestiram camisetas e levaram cartazes, pirulitos e faixas, para pedir novas eleições e protestar contra os projetos de reformas trabalhistas e da previdência. Outros, exibiam frases de apoio ao juiz Sérgio Moro, às investigações da operação Lava Jato conduzida pela Polícia Federal. Um dos manifestantes recorreu à irreverência para mostrar toda a sua indignação com o cenário político do país: carregou para o desfile uma mala decorada com notas de dinheiro, em alusão ao ex-deputado Rocha Loures, que aparece em um vídeo com uma mala que teria a quantia de R$ 500 mil.

*Foto de capa: Henrique Mendes

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