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“Lições de Resistência” resgata a obra jornalística de Luiz Gama

Por Luis Guilherme Pontes Tavares*

O novo livro da professora doutora Ligia Fonseca Ferreira sobre o poeta, jornalista, advogado, professor e abolicionista Luiz Gonzaga Pinto Gama (1830-1882) oferta ao leitor a inédita oportunidade de conhecer a obra jornalística desse brasileiro que nasceu livre na capital baiana, foi vendido pelo pai como escravo e agigantou-se em São Paulo como aquele que obteve na Justiça a alforria para mais de 500 escravizados.

Lições de Resistência. Artigos de Luiz Gama na imprensa de São Paulo e do Rio de Janeiro (São Paulo: Edições SESC, 2020) foi lançado no final de maio no formato e-book e terá, mais adiante, exemplares impressos em papel. A obra estampa pela primeira vez mais de 60 artigos que Gama publicou em jornais de São Paulo e do Rio de Janeiro, sendo que mais de 2/3 deles foram localizados pela pesquisadora Ligia Ferreira nos últimos.

Arquivo pessoal: Ligia Fonseca Ferreira | Adaptação: ABI
Arquivo pessoal: Ligia Fonseca Ferreira | Adaptação: ABI

Tive o privilegiado acesso ao material encaminhado pela Edições SESC à imprensa e pude ler as páginas pré-textuais, das quais exibo abaixo a epígrafe, um excerto de artigo do próprio Gama publicado na edição do Correio Paulistano de 10 de novembro de 1871; o prefácio do professor Luiz Felipe de Alencastro, titular da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, na qual também coordena o Centro de Estudos do Atlântico Sul (CEAS); e a introdução de 58 páginas na qual a professora Ligia Ferreira circunstancia a obra jornalística de Luiz Gama.

A epígrafe

“Se algum dia, os respeitados juízes do Brasil, esquecidos do respeito que devem à lei e dos imprescindíveis deveres que contraíram perante a moral e a nação corrompidos pela venalidade ou pela ação deletéria do poder abandonando a causa sacrossanta do direito e por uma inexplicável aberração faltarem com a devida justiça aos infelizes que sofrem escravidão, eu, por minha própria conta sem impetrar o auxílio de pessoa alguma, e sob minha única responsabilidade, aconselharei e promoverei, não a insurreição, que é um crime, mas a ‘resistência’, que é uma virtude cívica.”

A edição de Lições de resistência é bem cuidada, tanto na forma quanto no conteúdo, e distribui textos e ilustrações em cerca de 400 páginas impressas em duas cores: mancha em preto e destaques em vermelho. Os artigos de Luiz Gama são seguidos de notas da autora, que auxiliam a compreensão de textos, alguns dos quais de viés jurídico. A professora Ligia Ferreira acentua que a atuação de Gama na imprensa paulista e carioca completava e oferecia mais visibilidade a sua ação como defensor do fim da escravidão no Brasil.

Retrato de Luiz Gama de Angelo Agostini
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀  Angelo Agostini retrata Luiz Gama

Gama, informa a professora Ligia Ferreira, foi proprietário do periódico O Polichinelo, ilustrado por Nicolau Huascar de Vergara (18??-188?), discípulo de Angelo Agostini (1843-1910). A Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (IMESP) publicou, em 1981, edição fac-similar com as 37 edições desse jornal ilustrado. A propósito, Lições de resistência não exibe artigo de Gama publicado nesse jornal que lhe pertencera e que circulara entre abril e dezembro de 1876.

Destaco, por enquanto, pois ainda não li o novo livro da professora Ligia Ferreira, o artigo de Luiz Gama “À forca o Cristo da multidão”, publicado em 21 de abril de 1882, cerca de quatro meses antes da sua morte, no jornal carioca Tiradentes, no qual o jornalista, numa articulação com o Partido Republicano, reage à manutenção da estátua equestre de Pedro I (1798-1834) no Largo da Lampadosa, local em que o mártir mineiro fora enforcado e esquartejado em 1792. Reclamava que se erguesse ali a estátua do herói da Conjuração Mineira. Isso não aconteceu, mas o nome de Tiradentes foi adotado para a praça em que Pedro I permanece altivo em seu cavalo.

A autora convive com o tema da vida e da obra de Luiz Gama há muito, de modo que o designa pelas iniciais LG e jamais o confunde com marca de televisão ou assemelhado. Dedica-lhe o respeito apropriado a quem enxerga como modelo de brasileiro, alguém que o país reconhece como herói da Pátria. Sobre Gama, ela é autora, também, dos livros Primeiras prosas burlescas & outros poemas (São Paulo: Martins Fontes, 2000) e Com a palavra, Luiz Gama. Poemas, artigos, cartas, máximas (São Paulo: Imprensa Oficial, 2011).

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*Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É diretor da ABI.<[email protected]>

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).

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Jornais baianos investem em transmissões ao vivo através de plataformas digitais

Em tempos de pandemia, mais da metade da população baiana permanece em casa, como única forma de evitar a contaminação pelo novo coronavírus. Segundo dados da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), o isolamento social no estado já chegou a ser de 53,33%, em 22 de março. Para aproveitar essa nova realidade, veículos baianos marcados pela circulação de seus jornais impressos têm se mostrado perspicazes no uso das plataformas digitais, em especial do Instagram e das transmissões ao vivo, as famosas “lives”. Os três maiores jornais impressos da Bahia, Correio*, A Tarde e Tribuna da Bahia, intensificaram a presença online neste período, apostando em projetos que vão desde programas de entrevistas até boletins e newsletters com as principais matérias publicadas.

O Correio*, jornal de maior circulação no estado, antes mesmo da pandemia já havia adotado a estratégia, não apenas no Instagram, mas também no Facebook. “Junto com a Rede Nordeste, que é um grupo formado pelos três maiores jornais da região, já tínhamos uma grade de transmissões”, relata Wladmir Pinheiro, jornalista e mestre em cibercultura pelo programa de pós-graduação da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Ele atua como  coordenador de mídia digital e colaborador do veículo da Rede Bahia há mais de dez anos.

Leia também: Atividade jornalística no ambiente digital: O marketing tem a ver com isso?

De acordo com Wladmir, a emergência da pandemia fez o Correio* mudar o recorte e obter maior engajamento com os leitores. Com transmissões ao vivo que pontuam entre seis e 30 mil visualizações, o Correio* tem apostado em debates emergentes como saúde e bem-estar. “A audiência é importante, mas se não estiver bem alinhada às estratégias de assinatura são números quase vazios”, pondera o jornalista.

A Tribuna da Bahia, com 50 anos de história, tem sua primeira live no Instagram registrada no dia 26 de maio. A mediadora de todas as transmissões realizadas até então é Fan Teixeira, jornalista, colunista do jornal e apresentadora do programa Balaio de Gato, exibido pela TVE. De acordo com a colaboradora da Tribuna, “o projeto visa abrir o diálogo entre o jornal e a sociedade de forma objetiva e direta, trazendo à luz e ao debate temas mais comentados da atualidade, através de entrevistas com personalidades do cenário nacional”.

A Tribuna conta com as estratégias da Loft Comunicação, agência responsável pelo setor de marketing digital do veículo. De acordo com Fan, “a ideia das transmissões é estar conectado durante esse período de pandemia com o maior número possível de seguidores que, leitores ou não do jornal impresso, cheguem às redes em busca de uma conversa inteligente, acessível e com conteúdo atual e de qualidade”, explica a jornalista.

O Correio* ressalta ter crescido cinco vezes em visitas no Instagram, e aumentado em mais de 20% o número de seguidores. No digital, tem tido recorde de acessos. “Cada canal tem sua estratégia, que é definida de acordo com um plano maior de engajamento, relevância e assinatura. O desempenho é avaliado de acordo com essa estratégia maior”, ressalta Wladmir Pinheiro.

Com a Covid-19, o Instagram viu o uso das transmissões ao vivo crescerem em 70% somente durante o mês de março. Há cerca de um mês, em maio, as lives passaram a poder ser salvas no IGTV, aplicativo de vídeo secundário ao Instagram e pertencente ao Facebook. Antes as publicações só podiam ser salvas durante 24 horas. 

A Associação Bahiana de Imprensa (ABI) procurou o A Tarde para tratar dos resultados da investida do Projeto A Tarde Conecta, divulgado no site da Associação, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O jornal tem feito também transmissões a partir da fanpage no Facebook. 

Encontre as transmissões ao vivo dos veículos citados nesta matéria em: 

A Tarde 

Correio* 

Tribuna da Bahia

 

*I’sis Almeida é estagiária de Jornalismo da ABI
Supervisão: Joseanne Guedes

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ABI BAHIANA

Comunicado: ABI suspende atendimento ao público

Em virtude das orientações de isolamento social, como medida preventiva contra o novo coronavírus, informamos que o atendimento presencial na sede da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) está suspenso. O expediente seguirá em sistema home office.

Disponibilizamos, em caráter de plantão, o endereço de e-mail da superintendência da entidade: <[email protected]>, responsável por redirecionar as demandas do público às equipes adequadas.

Walter Pinheiro
Presidente

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Casa Ninja atrai diversidade cultural na 2ª temporada em Salvador

Quem adentra o casarão bem em frente à Praça Colombo, no Rio Vermelho, bairro mais boêmio de Salvador, mal reconhece o espaço onde funcionava o Red River Café, restaurante dedicado à classe média alta, fechado em 2016. O local antes ocupado por 120 mesas para atendimento ao público de elite, agora recebe um fluxo de pessoas muito diferentes do que por ali já foi visto. A Casa Ninja, iniciativa de uma das redes de comunicação livre mais conhecidas – senão a mais conhecida do país –, a Mídia Ninja, está funcionando no antigo estabelecimento. O projeto está em sua segunda temporada em Salvador. Em 2019, o endereço da Casa era na Barra.

A Mídia Ninja foi criada durante as manifestações de junho em 2013 e ganhou notoriedade por causa das coberturas que realizou de dentro dos protestos. As principais ferramentas para acompanhar as manifestações eram dispositivos móveis e o meio de divulgação, as redes sociais. Segundo os fundadores, a Mídia é resultado das ações desenvolvidas pelo circuito Fora do Eixo, uma rede de coletivos culturais surgida no final de 2005. Reconhecida internacionalmente, a Ninja, em 2014, foi definida pelo jornal The Washington Post como um grupo “interessado em apresentar uma narrativa alternativa aos principais meios de comunicação, informando ao vivo da linha de frente”.

A Associação Bahiana de Imprensa (ABI), conversou com Dríade Aguiar, uma das fundadoras Ninja, dentre outros responsáveis pelo projeto, para saber quais as principais diferenças entre a primeira e a segunda temporada da Casa Ninja; e quais são as expectativas até o dia 08 de março, quando está previsto o encerramento das atividades de verão do projeto em Salvador. 

O espaço – Bem de frente para o mar da orla do Rio Vermelho trabalham os cinco colaboradores responsáveis pela Casa. São eles: Dríade, Felipe, Lisa, Slash e Phil. No primeiro ambiente do espaço, é possível visualizar em um quadro improvisado, feito de cartolinas e preenchidos por post-its, a programação do projeto, pelo menos até o meado de fevereiro. No dia 2, durante a tradicional festa em homenagem a Iemanjá, aconteceu, por exemplo, a “Feijoada Ninja”, oferecida pela Casa e realizada pelo “Afrochef” Jorge Washington. A atividade foi nomeada como “Culinária Musical” e contou com a apresentação da cantora Denise Correia, da Banda “Na Veia da Nega”. 

Virando à esquerda, mais adiante, é possível visualizar a antiga cozinha do Red River, onde agora são preparadas as refeições dos colaboradores Ninja e de outras atividades que acontecem no local. No salão principal, destacam-se as paredes pretas e o gradil que separa a mesa de trabalho de Dríade e o restante da equipe com vista para as águas do Rio Vermelho. É ali também, no mesmo salão onde fica localizado o palco por onde já passaram nomes como Anielle Franco (irmã da ex-vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018), Guilherme Boulos (ex-candidato à presidência pelo PSOL) e a reconhecida socióloga e ativista baiana, Vilma Reis.

Dríade Aguiar – Fundadora Ninja | Foto: I’sis Almeida (ABI)

Origem do projeto – A Casa Ninja é, segundo Dríade, resultado de uma demanda de ações territoriais (ou seja, no âmbito físico) que a Mídia Ninja decidiu realizar logo após o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff e a confirmação da candidatura do atual presidente Jair Messias Bolsonaro. Ela conta que tudo começou com um processo de pesquisa de público para realização de ações em todo país. “O resultado acabou nos levando a atender a um chamado”, afirmou a gestora. A Bahia correspondeu a 70% do índice de respostas da pesquisa enquanto consumidores de conteúdo e interessados pelos debates e ações desenvolvidas a partir da Mídia e Fora do Eixo.

Temporadas – A primeira temporada da Casa Ninja esteve em Salvador durante o verão de 2019. Dríade Aguiar afirma que estar no Rio Vermelho tem sido “um pouco diferente” da temporada na Barra. No ano anterior, a estratégia era movimentar o público da cidade para rodas de conversa, oficinas, ensaios e uma programação intensa que ocorria no bairro da Barra, predominantemente, no lado de fora da Casa, no passeio de frente à orla local, ou seja, na rua. “Quando a gente veio para a Barra, no ano passado, foi muito na ideia de balançar as coisas. Ali tem uma mistura. Turistas, moradores, mas também tem uma galera de prédio, que não concordava com a nossa presença naquele local. Então, estar na Barra misturaria um pouco as coisas e causaria um choque”, explica Dríade.

Já a segunda temporada tem sido bem diferente, principalmente no que diz respeito ao público que está participando da programação. A Casa abriu um edital para inscrições de atividades e, a partir dele, vem montando uma grade de programação diversa, atraindo diversos públicos que não apenas os consumidores de conteúdo da Mídia Ninja. Além de rodas, oficinas, palestras e eventos direcionados a reflexões sociais e políticas, a organização tem intensificado o investimento em cultura, cedendo a casa para realização de shows e outras manifestações culturais. Os cinco colaboradores que trabalham diariamente na atual temporada também se dividem em visitas a locais de Salvador que não necessariamente são visibilizados pelo poder estatal e pela mídia tradicional. O objetivo, de acordo com o grupo, é construir uma grande rede de fortalecimento para o ativismo. 

Por que Rio Vermelho? – Segundo os colaboradores, o Santo Antônio Além do Carmo e o Rio Vermelho sempre eram indicados por moradores de Salvador. A escolha do Rio Vermelho se deu primeiro pelas inúmeras indicações, bem como pela parceria estabelecida com a Associação Bem-te-vi, também proprietária da conhecida Casa Rosa, localizada no mesmo bairro, mas ainda não inaugurada. “Quando a gente pensou em vir para este espaço, também pensamos na história que reescreveríamos aqui”, ressalta Dríade Aguiar. “A Mídia Ninja é financiada através das doações dos nossos seguidores. É por isso que falamos sempre sobre a importância de financiar e colaborar com o ativismo, pois entendemos que, no contexto político em que vivemos, a saída é colaborativa! ”, exclama a gestora.

Quem está na casa? – A entrada para as atividades realizadas via edital estão sendo no estilo “pague o quanto puder”. No entanto, a contribuição não é obrigatória e para pessoas trans ou não binárias, não é realizado nenhum tipo de cobrança para quaisquer eventos da programação. Essa é uma política adotada pela Mídia Ninja, especialmente entendendo que, para que pessoas trans possam participar de atividades culturais da Casa, ou de qualquer outro espaço, é preciso viabilizar o acesso, bem como fazer com que as mesmas se sintam seguras no local. “Estamos abertos quando a pessoa não quer doar. Isso está servindo também para entendermos o público, para entender o que traz, quem está vindo protagonizar naquele determinado dia”, destacou Dríade.

O público tem variado de acordo com quem está se apresentando. E para a equipe responsável pela Casa, isso tem impacto positivo para a produção. “Quando fazemos uma noite LGBT e periférica, temos uma expectativa diferente de quando fazemos MPB. E estamos felizes nos dois, pois isso tem servido para entendermos e mapearmos nosso público”. A programação vem sendo publicada sempre através das redes sociais. “A gente tem divulgado a programação semanalmente. Então, se você acompanhar nosso Instagram, aos domingos, sai tudo o que rola na semana”, garante Dríade.

Para mais informações: acompanhe a Casa Ninja no Instagram

*I’sis Almeida é estagiária da ABI, sob a supervisão de Joseanne Guedes.

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