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Livros “raros” furtados da Biblioteca Jorge Calmon são devolvidos

Por Ernesto Marques*

Entre aficionados por livros, diz-se que livro raro é todo aquele que, uma vez emprestado, é devolvido. O que dizer, então, de livros furtados, devolvidos a uma biblioteca? É o caso de três títulos da coleção do pai da crítica cinematográfica brasileira, Walter da Silveira, cuja biblioteca pessoal integra o acervo da Biblioteca Jorge Calmon, da Associação Bahiana de Imprensa. “Plano 2-3” título de uma edição dos Cadernos Antológicos de Cinema e Teatro, “A aventura do Cinema” e “Menaces – sur le cinema” foram deixados como encomenda anônima na recepção do Ed. Ranulfo Oliveira alguns meses atrás. Devolvidos assim, quase tão furtivamente quanto foram subtraídos do acervo da Biblioteca, quase 20 anos atrás.

O larápio arrependido não precisou a data exata do furto, mas a “confissão” se deu numa noite de abril ou maio de 2003. No meio de uma maratona para editar um documentário sobre o Vale do Pati, lugar especialmente encantado da Chapada Diamantina, pausa para uma pizza, depois de longas horas em frente aos monitores da ilha de edição.

O produtor e aspirante a assistente de direção providenciou pizza e refrigerantes para todos. Extasiados com as imagens capturadas em seis dias de caminhada pelo diretor de fotografia, Fábio Marconi, e a singeleza do depoimento de Seu Massú, patizeiro sábio e resiliente, discutíamos os rumos do meu roteiro para o filme dirigido por Péricles Palmeira. Referências de documentários, filmes e diretores. A câmera na mão de Dib Lutfi elevou a conversa para as técnicas de fotografia em cinema e aos livros sobre o assunto.

Eis que o aspirante a assistente de direção, querendo fazer bonito na cena, resolve se gabar, narrando visita à biblioteca da ABI – como se referia à Biblioteca Jorge Calmon. Lá estavam cerca de 500 títulos sobre cinema, comprados junto à família de Walter da Silveira alguns anos após sua morte. Discorreu sobre o acervo com empolgação e destacou o que considerava o melhor do melhor: não era possível pegar livros por empréstimo, mas era fácil roubar, porque não havia câmeras. Bastava um instante de desatenção dos funcionários para destacar páginas ou esconder livros na mochila.

Ouvia um testemunho precioso, que não ouviria se aquele larápio soubesse da minha relação com a entidade e com a própria Biblioteca Jorge Calmon. Até que veio a confissão do crime: tinha levado alguns livros e vandalizado outros.
Aliviei no tom, mas não nas palavras. “Você se acha muito esperto por ter abusado da confiança da bibliotecária, mas, como malandro demais se atrapalha, você confessou o roubo para um diretor da ABI”. Os demais rolavam de rir com a cara do sujeito.

E avisei: se não devolvesse os volumes roubados, era melhor nunca mais aparecer por lá, ou eu o constrangeria, pedindo aos funcionários para não tirar os olhos dele. “A ABI faz um esforço para manter o acervo em boas condições e acessível a pessoas como você, para ter aquele comportamento como retribuição? Não tem vergonha de contar um ato covarde e desonesto como se fosse um grande feito, diante de pessoas que poderiam se interessar por pesquisas na área?”

Passei quase mais de 15 anos encontrando o sujeito em eventos ou via redes sociais e sempre cobrava a devolução, mas nunca o expus. Quando, em 16 de setembro de 2015, a família Walter da Silveira nos doou todo o acervo, mandei mensagem para o dito cujo e reforcei a cobrança. Prometeu devolver algumas dezenas de vezes, sempre com desculpas criativas. A última: após mais uma separação, os livros estavam em alguma caixa, mas sabia onde.

Um belo dia nos “encontramos” numa rede social, comentando uma postagem do jornalista e editor de livros, Gonçalo Jr. O assunto era corrupção e o ladrão de livros fez um comentário falso-moralista. Respondi duramente com indiretas compreensíveis somente ao meliante. Gonçalo não entendeu a minha virulência e eu expliquei em mensagem privada. Talvez isso tenha ajudado o sujeito a refletir sobre seus mal feitos. Talvez Gonçalo o tenha repreendido, por serem amigos. Ou foi aquela velha história de água mole em pedra dura – neste caso, em cara dura.
O importante, descontada a demora, é que o ladrão arrependido, ainda que tardiamente, devolveu três livros. Não estou seguro de serem todo o produto do furto e não há como sabê-lo.

E o acervo de Walter da Silveira está lá, sendo restaurado página por página, livro por livro. Já chegamos a investir R$ 3 mil no restauro de um único livro. Sem apoios ou patrocínios. Dele se serviram o jornalista Cláudio Leal, em sua pesquisa para o mestrado na USP; a professora da Uneb, Isabel Melo, no seu doutorado; a jornalista e professora da UFRB, Cyntia Nogueira. Coordenando uma equipe de pesquisa, ela finaliza um trabalho de fôlego sobre o pai da crítica cinematográfica brasileira e marejava os olhos, emocionada a cada foto, carta ou rabisco do mestre, guardados em caixas há décadas. Um tesouro redescoberto aos poucos. Porque formar acervos bibliográficos, documentais ou de qualquer natureza, só faz sentido se for para isso: compartilhar e produzir conhecimento.

*Jornalista e vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI). Texto originalmente publicado no Facebook do autor, no dia 7 de outubro de 2019.

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ABI recebe exemplares do Correio da Chapada

Na manhã desta quinta-feira (5), a Associação Bahiana de Imprensa (ABI) recebeu a doação de 13 edições do Correio da Chapada, jornal que circulou em cidades como Palmeiras, Lençóis, Itaberaba, Seabra, Abaíra, Rio de Contas, Mucugê, Piatã, Jussiape e região, entre os anos de 1989 a 2009. Os exemplares foram doados pelo fundador, o jornalista e escritor Renato Luís Bandeira, e farão parte do acervo do Museu de Imprensa da ABI.

Em seu primeiro editorial, datado de setembro de 1989, o impresso afirma que o seu principal objetivo era manter acesa a memória e a tradição local, enquanto, ao mesmo tempo, lutar pelo desenvolvimento da região. “O Correio da Chapada nasce a partir desta necessidade. Certo de que qualquer iniciativa do gênero deve ser embasada no conceito de informar sem a preocupação de trilhar os caminhos estabelecidos pelas tendências ou conveniências, procurando assim destorcer as notícias para agradar grupos”.

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Segundo Renato, as pessoas ficavam ávidas pelas matérias do Correio. “Além de política, abordávamos cultura, história e artigos com assuntos relacionados à Chapada Diamantina. Era o principal jornal artesanal da época”, explica.

O jornalista ainda destacou a importância da doação feita para a ABI. “Meu objetivo é tentar contribuir na preservação da imprensa do interior. Sem falar que nos exemplares contém artigos históricos que podem interessar estudantes e pesquisadores”.

O material será catalogado e, em breve, disponibilizado ao público.

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Biblioteca da ABI incorpora acervo pessoal do jornalista e professor Sérgio Mattos

A Biblioteca de Comunicação Jorge Calmon, da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), recebeu uma coletânea especializada de 2.436 livros. A doação foi feita nesta quarta-feira (13) pelo jornalista, pesquisador, educador e autor Sérgio Mattos, que integra a diretoria da instituição. Assim como o site que reúne sua obra, a seleta abrange preciosidades e uma das maiores concentrações de periódicos acadêmicos na Bahia. Entre os títulos, há também livros de literatura escritos por biógrafos, contistas, cronistas, poetas, romancistas e jornalistas de várias gerações, em uma importante iniciativa rumo à preservação da memória da comunicação no estado.

A maioria dos livros está autografada pelos autores, o que eleva a estima e o valor individual do acervo. “É impossível quantificar o sentimento que devotei a cada um desses livros, que me acompanharam na vida, como verdadeiros filhos, em minhas conquistas e em meus fracassos. São livros dos quais sinto ciúme, pois fazem parte de minha vida”. Mattos conta que se envolveu sentimentalmente na seleção. “Peguei cada um desses livros, recordando os bons momentos desfrutados em diferentes épocas de minha vida”, confessou. O restante de seu acervo será fracionado entre bibliotecas municipais ou universitárias da Bahia.

Emocionado, Sérgio Mattos recordou um dos principais teóricos da Comunicação no Brasil, o amigo José Marques de Melo, falecido em junho de 2018. Entre as publicações doadas por Mattos está grande parte dos livros escritos e organizados por José Marques, a exemplo da Revista de Comunicação da Intercom, a única revista brasileira de comunicação a ter o reconhecimento do Qualis A e indexação internacional. “Foi o primeiro doutor em Jornalismo do país, um líder da área da comunicação a quem devemos tudo o que conseguimos no que diz respeito ao reconhecimento da importância de nossa área no Brasil”, destacou.

  • Leia aqui a íntegra do pronunciamento de Sérgio Mattos

 “Minha expectativa é que, aqui na ABI, meus livros serão bem tratados e terão condições de melhor  servir à comunidade e aos pesquisadores do que se permanecessem trancados  em meu gabinete”, ponderou. “Sinto-me renascer com esta doação, pois estou compartilhando pedaços de minha vida com vocês”. O professor manifestou ainda o desejo de que seu gesto acelere as obras do Museu de Imprensa e a expansão da Biblioteca Jorge Calmon, onde também se encontram acervos doados pelas famílias de João Falcão, Walter da Silveira e José Augusto Berbert de Castro.

Na primeira reunião de diretoria em 2019, o presidente da ABI, Walter Pinheiro, registrou os agradecimentos pela doação. “Esse acervo que ele encaminhou para a nossa guarda é uma parte da sua alma, uma parte da sua vida muito bem registrada”, afirmou. O dirigente ressaltou o privilégio de conviver com Mattos. “Sempre tivemos a convicção daquilo que Sérgio Mattos, um cearense que veio emprestado e que aqui ficou baiano, é para a nossa cultura e para a imprensa baiana. A ABI tem a obrigação de zelar por esse patrimônio”, disse.

“Sérgio nos doa um tesouro. Mas o maior tesouro que essa doação traz é esse imenso sentimento dele, é muito coração”, comentou o diretor de Patrimônio da ABI, Luís Guilherme Pontes Tavares. Para Valber Carvalho, diretor de Comunicação da ABI e ex-aluno de Sérgio, o acervo vai atrair cada vez mais estudantes para a Biblioteca Jorge Calmon, pois a seleta é composta por documentos que não são facilmente encontrados. “Dá para ver que ele está emocionado. Ter livros guardados, escolhê-los, demanda tempo e carinho. A gente agradece, fica feliz por esse compartilhamento”, concluiu o jornalista.

O advogado Antônio Luiz Calmon Teixeira doou à ABI um DVD que registra traslado dos restos mortais de Ruy Barbosa para Salvador – Foto: Joseanne Guedes/ABI

Quem também fez uma importante doação à ABI foi o advogado Antonio Luiz Calmon Teixeira. Ele se associou às comemorações dos 170 anos do nascimento de Ruy Barbosa, que ocorrerá em novembro, e ofertou à Associação um DVD da filmagem “Volta de Ruy à terra natal”. Segundo ele, o vídeo registra o traslado dos restos mortais do jurista para cripta no Fórum Ruy Barbosa, em 1949, ano em que se comemorou os 400 anos de fundação da cidade do Salvador.

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ABI e Fundação Pedro Calmon debatem preservação da memória da imprensa

A Associação Bahiana de Imprensa (ABI) promoveu uma reunião com a Fundação Pedro Calmon (FPC), na manhã desta sexta-feira (27/07), para discutir medidas de preservação do acervo sobre a imprensa no estado. As atividades dão continuidade ao acordo de cooperação técnica firmado entre as duas instituições, como parte da produção do projeto “Memória da Imprensa na Bahia”.

O principal objetivo do encontro foi desenvolver ações para salvaguardar o importante acervo da ABI. A instituição possui livros raros e documentos históricos, um conjunto formado por coleções de revistas especializadas, jornais, fotografias, além das bibliotecas pessoais de jornalistas como Jorge Calmon, João Falcão e Berbert de Castro. As obras abrigadas pelo Museu de Imprensa da ABI e pela Biblioteca de Comunicação Jorge Calmon procedem também do acervo de outros personagens centrais para a história da imprensa e do cinema baianos, como o cineasta Walter da Silveira.

“Vamos organizar o acervo, a partir da NOBRADE [Norma Brasileira de Descrição Arquivística]. A primeira atividade será iniciada na terceira semana do mês de agosto, com a digitalização dos boletins da ABI”, afirmou Valdicley Vilas Boas, coordenador de Documentação do Centro de Memória da Bahia, unidade da Fundação Pedro Calmon.

O vice-presidente da ABI, o jornalista Ernesto Marques, ressalta que a aproximação entre as instituições vai possibilitar cuidar melhor do que a entidade possui e estudar alternativas para ampliar o trabalho, tornando o acervo cada vez mais acessível. “Cuidar de acervo histórico é sempre muito trabalhoso e caro, essa é uma dificuldade que temos. Ficamos comprometidos e com um olhar mais audacioso, no sentido de desenvolver outras atividades em conjunto, por conta de tudo o que temos guardado aqui. É um volume muito grande que demanda um permanente trabalho de restauro”.

Participaram da reunião o diretor de Patrimônio da ABI, Luis Guilherme Pontes Tavares; o coordenador de Pesquisa da FPC, Walter Silva; o secretário da ABI, Márcio Müller; a técnica em restauro e conservação da ABI, Marilene Rosa; a bibliotecária da ABI, Valésia Oliveira; e a museóloga da ABI, Renata Santos, responsável pelo Museu de Imprensa da ABI. O espaço, que está em fase de reestruturação, foi criado para preservar a história da imprensa, através do seu acervo de periódicos, volantes, obras e objetos pertencentes a jornalistas. Já a Biblioteca de Comunicação Jorge Calmon funciona de segunda a quinta, das 8h às 17h, e durante as sextas, das 8h às 12h.

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